Representação Namban de uma Carraca portuguesa. |
António Gedeão
Lancei ao mar um madeiro,
espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
medi a altura do sol.
Deu-me o vento de feição,
levou-me ao cabo do mundo.
Pelote de vagabundo,
rebotalho de gibão.
Dormi no dorso das vagas,
pasmei na orla das praias,
arreneguei, roguei pragas,
mordi peloiros e zagaias.
Chamusquei o pêlo hirsuto,
tive o corpo em chagas vivas,
estalaram-me as gengivas,
apodreci de escorbuto.
Com a mão direita benzi-me,
com a direita esganei.
Mil vezes no chão, bati-me,
outras mil me levantei.
Meu riso de dentes podres
ecoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
rompi as arcas e os odres.
Tremi no escuro da selva,
alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
mulheres de todas as cores.
Moldei as chaves do mundo
a que outros chamaram seu,
mas quem mergulhou no fundo
do sonho, esse, fui eu.
O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal.
"Poema da malta das naus" em Teatro do Mundo, 1958.
Fontes
- "Poema da Malta das Naus", no YouTube.
- "Poema da malta das naus", em Centro de Investigação para Tecnologias Interactivas (CITI) da FCSH/UNL
- "Arte Nanban", na Wikipédia.
Referências
- "Visita Guiada aos Biombos Namban (Japão) , no Museu Nacional de Arte Antiga , em Lisboa - Portugal", no YouTube.
- "A História dentro dos Biombos Namban", em Museu Nacional de Soares dos Reis.
- "Biombos de Namban", em Flanagens.
Etiqueta principal: História.
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