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30 de janeiro de 2019

Racismo Português




Não me envergonhe, dr. António Costa!!!

Por Camilo Lourenço no Jornal de Negócios a 27 de Janeiro de 2019 às 21:30

Portugal não é um país racista; é um país onde, isoladamente, acontecem casos de racismo. Aliás, seria estranho qualificar de racista um país que tem governantes oriundos das ex-colónias (já olharam para a ascendência de Marcelo?), o primeiro negro (Mário Coluna) a capitanear uma seleção europeia e um negro como militar mais condecorado da sua História…

Há uns anos recebi uma chamada da jornalista Fernanda Câncio que, a propósito da ascensão de António Costa, queria falar sobre goeses em destaque na sociedade portuguesa. Antes de continuar, fica o esclarecimento: eu sou um produto do Império, filho de pai branco (Benedita, Portugal) e mãe indiana (Pangim, Goa).

O meu pai foi fazer serviço militar para a antiga Índia portuguesa e casou-se por lá (a diferença entre mim e António Costa é que ele é filho de pai goês e de mãe branca). Quando a União Indiana invadiu Goa, o meu pai fez parte do grupo de 800 militares presos num campo de concentração, de onde seria mais tarde recambiado para a "metrópole"… e de onde seguiu para Moçambique, para combater o terrorismo.

Voltemos à conversa: a certa altura, a Fernanda perguntou-me pelo racismo em Portugal e se não era afetado por ele. Expliquei-lhe que salvo casos isolados, em finais dos anos 70 quando regressei à "metrópole" (por causa de uma descolonização vergonhosa que só a Esquerda chama de "exemplar"), não sabia o que era racismo. Julgo que lhe expliquei também que esporadicamente ainda sou mimoseado com expressões racistas, maioritariamente vindas de radicais de esquerda, quando escrevo textos críticos no "Negócios" ou no FB. Mas como a Fernanda insistia no racismo (pareceu-me que acreditava ser Portugal um país racista), expliquei-lhe que uma coisa é racismo como política ou como problema endémico da sociedade e outra, totalmente diferente, o comportamento isolado de algumas pessoas (a quem chamo de energúmenos).

Nunca percebi se a Fernanda chegou a publicar alguma coisa, mas vou repetir o que lhe disse então: Portugal não é um país racista; é um país onde, isoladamente, acontecem casos de racismo. Aliás, seria estranho qualificar de racista um país que tem governantes oriundos das ex-colónias (já olharam para a ascendência de Marcelo?), o primeiro negro (Mário Coluna) a capitanear uma seleção europeia e um negro como militar mais condecorado da sua História…


Marcelino da Mata, fardado.

Voltando ao meu pai, com quem desde cedo comecei a discutir a inevitabilidade da independência das colónias, ele costumava lembrar-me que Goa fora a única colónia a ter um vice-rei (o Brasil teve Rei, mas fugido de Lisboa…). E dizia que o melhor exemplo de que Portugal não discriminava as colónias, e quem lá vivia, era o investimento que lá fazia: ainda hoje quem vai a Maputo, 43 anos depois da independência, fica pasmado a olhar para uma cidade e um modo de vida muito à frente de Lisboa ou de outra cidade portuguesa da época…

Quando ouvi o primeiro-ministro responder a Assunção Cristas com referências à cor da pele, fiquei estupefacto: o político que não teve problemas em chegar a ministro, a líder do PS e a primeiro-ministro inventa discriminação racial? Porquê? Por recalcamento? Para se fazer de coitadinho e capitalizar o voto da extrema-esquerda, que precisa de causas novas para ser notícia? Lamentável. António Costa é o melhor exemplo de que isso não existe. Tem críticos a chamar-lhe "chamuça", "indiano" ou "caneco" (como se chamava em Moçambique aos oriundos de Goa) em tom depreciativo? Sim, mas são casos isolados.

Não há coisa pior numa sociedade do que inventar "causas" que não têm qualquer correspondência com o sentir coletivo. António Costa, o homem que tem o PS e o país rendido a seus pés, não pode cair nessa esparrela. É por isso que deve um pedido de desculpas ao país.

Para o final fica um pedido: não volte a fazer aquela figura. Já me chega a vergonha que me fez sentir no debate quinzenal.




Sinalização da Própria Virtude

Por Álvaro Aragão Athayde em coisas & loisas a 30 de Janeiro de 2019 às 15:38.

O texto de Camilo Loureço, que acima transcrevi, e o de Gabriel Mithá Ribeiro, de que abaixo forneço referência, destacam-se entre todos os que li sobre este tema por os autores não fazerem Sinalização da Própria Virtude (Virtue Signalling), isto é, não afirmarem algo do tipo “Eu não sou Racista… mas Portugal é Racista.”

Parece-me evidente que o Bloco de Esquerda e a Ala Esquerda do Partido Socialista, grupos que representam em Portugal a Esquerda Cultural, Esquerda Identitária, Marxismo Cultural, ou Nova Esquerda, estão empenhadíssimos em convencer o Mundo, e Portugal, de que Portugal é Racista.

Porque será?



Origem do texto

Origem da fotografia

Referências
  1. Costa ‘caneco’”, Gabriel Mithá Ribeiro, Observador, 26 de Janeiro de 2019 às 00:03.
  2. Jamaica. “Câmaras comunistas não querem o ónus de deitar barracas abaixo””, Sónia Simões, Observador, 29 de Janeiro de 2019.
  3. Virtue signalling”, Urban Dictionary.
  4. "A esquerda “identitária” diz adeus a Marx", José Pacheco Pereira, Público,  26 de Janeiro de 2019 às 06:45.
  5. "Nova Esquerda", Wikipédia, a enciclopédia livre.
  6. "Rudi Dutschke", Wikipedia, the free encyclopedia.


Etiqueta principal: Política.
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28 de janeiro de 2019

Poema da Malta das Naus

Representação Namban de uma Carraca portuguesa.






António Gedeão

Lancei ao mar um madeiro,
espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
medi a altura do sol.

Deu-me o vento de feição,
levou-me ao cabo do mundo.
Pelote de vagabundo,
rebotalho de gibão.

Dormi no dorso das vagas,
pasmei na orla das praias,
arreneguei, roguei pragas,
mordi peloiros e zagaias.

Chamusquei o pêlo hirsuto,
tive o corpo em chagas vivas,
estalaram-me as gengivas,
apodreci de escorbuto.

Com a mão direita benzi-me,
com a direita esganei.
Mil vezes no chão, bati-me,
outras mil me levantei.

Meu riso de dentes podres
ecoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
rompi as arcas e os odres.

Tremi no escuro da selva,
alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
mulheres de todas as cores.

Moldei as chaves do mundo
a que outros chamaram seu,
mas quem mergulhou no fundo
do sonho, esse, fui eu.

O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
nas praias de Portugal.

"Poema da malta das naus" em Teatro do Mundo, 1958.




Fontes
  1. "Poema da Malta das Naus", no YouTube.
  2. "Poema da malta das naus", em Centro de Investigação para Tecnologias Interactivas (CITI) da FCSH/UNL
  3. "Arte Nanban", na Wikipédia.


Referências
  1. "Visita Guiada aos Biombos Namban (Japão) , no Museu Nacional de Arte Antiga , em Lisboa - Portugal", no YouTube.
  2. "A História dentro dos Biombos Namban", em Museu Nacional de Soares dos Reis.
  3. "Biombos de Namban", em Flanagens.


Etiqueta principal: História.
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27 de janeiro de 2019

Os Conflitos das Zonas Cinzentas e a Guerra Ambígua




Próxima Conferência

Os Conflitos das Zonas Cinzentas e a Guerra Ambígua

31 Janeiro 2019

quinta-feira

 21:00 Horas





Etiqueta principal: Guerra Não Convencional.
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20 de janeiro de 2019

ASCUNO, o novo nome da CENSURA




O novo nome da CENSURA é ASCUNO, acrónimo de Autoridade de Segurança Cultural e NoticiosaA missão da Autoridade de Segurança Cultural e Noticiosa, ASCUNO, é dar cumprimento à legislação que vai ser publicada tendo em vista a “regulação da selva das redes sociais” para “não nos deixarmos render ao império das teorias conspirativas”, reforçar o “no nosso instinto vital democrático” e, também, a “nossa capacidade de resistir à toxicodependência mediática e de distinguir o verdadeiro do falso”.


E se Trump for mesmo um espião russo?

Não têm fim os hipotéticos cenários para as teorias da conspiração veiculadas pelas redes sociais.

Por Vicente Jorge Silva no PÚBLICO a 20 de Janeiro de 2019 às 08:00.

Trump espião russo? Salvini e Orbán marionetas de Putin ou o “Brexit” um cenário montado por Moscovo com o objectivo de lançar o caos na Europa? Já agora, Rio e Montenegro agentes de Costa para enfraquecer o PSD e dar ao PS a maioria absoluta? Não têm fim os hipotéticos cenários para as teorias da conspiração veiculadas pelas redes sociais e devoradas pelas multidões de novos toxicodependentes que as consomem e propagam. Vivemos num mundo onde parece cada vez mais difícil distinguir entre as fake news e as notícias verdadeiras, tal é a escorregadia opacidade que se instalou entre a verdade e a mentira.

Retomemos então a hipótese de Trump ser um espião russo, aprisionado nas malhas da submissão a Moscovo desde os tempos em que se envolveu em negócios imobiliários, concursos de misses e televisão ou aventuras sexuais na Rússia. Se tivermos em conta o padrão de comportamento de Trump, a desafiar permanentemente os limites da verosimilhança (ou da anedota delirante), essa hipótese acaba por aparecer como credível – sem esquecer o que se sabe das suas embaraçosas relações com Putin.

Aliás, no início da semana passada o New York Times referia que a guerra que Trump trava pela sua sobrevivência política faz com que o shutdown mais longo da história americana pareça reduzir-se a uma questão menor – sendo o pano de fundo dessa guerra os laços altamente comprometedores do Presidente americano com Moscovo.

Paradoxalmente, o raríssimo desmentido feito anteontem pelo procurador especial Robert Mueller a uma nova notícia que envolvia Trump nesse enredo mais parecia uma manobra táctica para mostrar a independência de julgamento do procurador (encarregado do inquérito às suspeitas de interferência russa na campanha presidencial a favor do candidato republicano) do que um efectivo desmentido.

Ora, se o próprio Presidente da maior potência global – apesar de se tratar de uma personagem tão inverosímil como Trump, o que já diz muito sobre o estado a que o mundo chegou – pode estar refém da sua dependência em relação à Rússia, isso não legitimará as teorias de conspiração que hoje tendem a propagar-se por meio das redes sociais? Por outro lado, quando os tenores do populismo através do mundo – e da Europa – se permitem espalhar aos quatro ventos as mais grosseiras distorções da verdade factual e são acolhidos por multidões de fiéis sedentos dessas mistificações, isso não será também um sinal de que as democracias estão em risco?

Num estudo da Universidade de Cambridge referido pelo Expresso em Novembro passado e na penúltima edição do magazine francês Obs, os dados recolhidos em nove países, incluindo Portugal, revelam uma inquietante vulnerabilidade às fake news e teorias conspirativas, que evoluíram de uma questão marginal para um fenómeno mainstream – segundo um dos autores do estudo, Hugo Leal. Curiosamente, Portugal é o país menos receptivo a essas teorias (onde predomina o tema migratório), embora seja aquele onde mais se acredita que um grupo secreto governa o mundo (42 por cento das opiniões) e que haverá sempre uma elite a sobrepor-se ao poder dos eleitos.

A velha sentença de Churchill – segundo a qual a democracia é um regime péssimo mas todos os outros são piores – nunca terá sido tão pertinente como agora. Ora, para além da necessária regulação da selva das redes sociais, a única verdadeira solução para não nos deixarmos render ao império das teorias conspirativas está em nós, no nosso instinto vital democrático, na nossa capacidade de resistir à toxicodependência mediática e de distinguir o verdadeiro do falso. O que é, convenhamos, cada vez mais problemático, quando as duas dimensões se misturam e a irrealidade de Trump ser um espião russo se pode revelar simplesmente…real.


Origem dos textos
  1. E se Trump for mesmo um espião russo? no Público.
  2. Álvaro Aragão Athayde em coisas & loisas.

Origem da figura


Etiqueta principal: Política.
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16 de janeiro de 2019

Progresso





Origem da figura
  • Old Boys Network.


Etiqueta principal: Curtas.
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11 de janeiro de 2019

Não existe ensino gratuito




Não existe ensino gratuito.

Não existe ensino gratuito, todo o ensino tem custos.

Os custos mínimos do ensino são os custos da alimentação de alunos e professores. Depois há os outros…

Podem não existir escolas e o ensino ser ministrado ao ar livre. Podem não existir livros e o ensino consistir na memorização das palavras do professor. Mas existem sempre alunos e professores que têm de comer. 

Logo os custos mínimos do ensino, os custos da alimentação de alunos e professores, são inescapáveis.

Em Portugal e em qualquer parte do Mundo.

Os custos do ensino, os mínimos e os outros, são sempre suportados pelos alunos, ou pelas suas famílias. 

No que concerne à alimentação dos alunos suponho que nenhum leitor contestará a  afirmação do parágrafo anterior.

No que concerne à alimentação dos professores o custo é suportado directamente quando os professores são pagos directamente, como acontece no caso dos explicadores, e suportado indirectamente quando os professores são pagos indirectamente, como acontece no caso dos pagamentos a instituições, estatais ou não estatais que, por sua vez, pagam aos professores.

No caso dos Sistemas de Ensino Estatais "Gratuitos", impropriamente ditos Sistemas de Ensino Públicos, o que acontece é que os alunos, ou as suas famílias, pagam os Impostos ao Estado e o Estado paga a alimentação aos professores, cobrando-se, como todos os intermediários sempre o fazem, de um tanto para as suas próprias despesas.

Não existe ensino gratuito, todo o ensino tem custos.

Não existe ensino gratuito.




Origem do texto

Origem da figura

Referências


Etiqueta principal: Política.
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9 de janeiro de 2019

Bricolage

FUCK YA’ALL
I'LL DO IT MYSELF


FODAM-SE TODOS
VOU FAZÊ-LO SOZINHO



A forma "ya'll" é eye dialect spelling de "you'll".



Origem da figura
  • Old Boys Network.

Etiqueta principal: Curtas.
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6 de janeiro de 2019

Conquista pela Dívida

There are two ways to conquer and enslave a country.
One is by the sword. The other is by debt.


Existem duas formas de conquistar e escravizar um país.
Uma é pela espada. A outra é por dívida.



Existem duas formas de conquistar e escravizar um país. 
Uma é pela espada. A outra é por dívida.

¡ só que a primeira forma procede de fora para dentro 
e a segunda de dentro para fora !

E se é relativamente fácil apercebermo-nos de que estamos ameaçados de ser conquistados pela espada é relativamente difícil apercebermo-nos de que estamos ameaçados de ser conquistados pela dívida.


A estratégia da conquista pela dívida consiste em convencer os governos do país a ser conquistado, bem como as demais pessoas individuais e colectivas desse país, a contraírem dívidas. 
Convencê-los a contraírem dívidas, de preferência elevadas, de preferência em bancos, ou em moeda, estrangeira.




O Bloco quer voltar a salvar bancos?

Agora vamos às perguntinhas de algibeira: 
Quem acha que vai acudir aos bancos?

Por Camilo Lourenço no Jornal de Negócios a 01 de Janeiro de 2019 às 21:30

Conquista e escravidão por dívida.

O Bloco de Esquerda quer que a entrega de casas aos bancos (que as tenham financiado) salde a dívida das famílias.

A solução permite que quem não queira continuar a pagar a hipoteca relativa ao imóvel que comprou, possa entregar esse imóvel ao banco e não ficar a dever nada.

Imaginemos a seguinte situação: você comprou uma casa por 150 mil euros. Entretanto o valor de mercado desse imóvel caiu para 130 mil euros. Você, porque ficou desempregado ou porque vai mudar de cidade (ou outra razão qualquer), devolve-o ao banco. Este, por causa da desvalorização, fica com uma dívida “extra” de 20 mil euros. 

Imagine agora esta situação multiplicada por dezenas de milhar de casos, com valores muito superiores ao considerado neste exemplo. A conclusão é óbvia, mesmo para quem não tenha feito um curso de Economia: os bancos vão registar menos-valias colossais. Com a consequente necessidade de constituirem provisões e aumentos de capital. Ao mesmo tempo passarão a estar na mira das agências de rating, com os inevitáveis downgrades

Agora vamos às perguntinhas de algibeira: quem acha que vai acudir aos bancos? Lembra-se dos milhares de milhões que os contribuintes tiveram de injectar nos bancos a seguir a 2011? Pois, é o que poderá acontecer se a proposta do Bloco for para a frente.

Os meses que antecedem as eleições são sempre de eleitoralismo barato. Mas a proposta do Bloco é mais do que isso: é eleitoralismo rasca, incompreensível num partido que está sempre a gritar que não está disposto a salvar bancos… mas faz exatamente o contrário.

Fim do artigo “O Bloco quer voltar a salvar bancos?”



Notícia da proposta do Bloco de Esquerda
Origem do artigo “O Bloco quer voltar a salvar bancos?”
Origem das imagens
  1. John Adams Debt and Sword Poster” from Zazzle; Product ID: 228813180084462145; Created on: June 23, 2012 at 22:47.
  2. A dívida como instrumento de conquista colonial do Egito” em Esquerda.net a 28 de Julho de 2016 às 00:41.
Referências e Bibliografia
  1. There are two ways to conquer and enslave a country. One is by the sword. The other is by debt.” from John Adams Quotes on Economy.
  2. John Adams” from Wikipedia, the free encyclopedia.
  3. Enslaved by Debt” from  Rock The Capital on July 20, 2011 at 14:38.
  4. Beyond the Greek Impasse” from Stratfor Worldview on Jun 30, 2015 at 08:00 GMT.
  5. The Absurdity of Student Loan Debt” from Medium on June 14, 2018.
  6. Debt bondage” from Wikipedia, the free encyclopedia
  7. A dívida como instrumento de conquista colonial do Egito” em Esquerda.net a 28 de Julho de 2016 às 00:41. 
  8. Como evoluiu o mercado automóvel desde 1974?” no Jornal de Negócios a 04 de janeiro de 2019 às 15:40.
Este texto em "pdf"

Etiqueta principal: Política.
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1 de janeiro de 2019

Alfredo Barroso & Jacques de Molay

Cruzes de Jerusalém e de Tomar.



Um artigo de Alfredo Barroso e um comentário de Álvaro Aragão Athayde.



artigo
Filipe o Belo e a reestruturação da dívida

Na manhã de 13 de Outubro de 1307, o Rei de França tomou para si a guarda dos bens da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo. O grão-mestre da Ordem, ex-banqueiro do monarca e de todos os príncipes da Europa, ardeu na fogueira. Foi uma das mais radicais reestruturações de sempre de uma dívida pública

Por Alfredo Barroso no Jornal i a 31 de Dezembro de 2018

No que respeita a finanças públicas, os portugueses, além de tementes a Deus (que não sabia nada de finanças), são ainda hoje dominados pelos fantasmas de Salazar, Cavaco, Gaspar e Centeno. Continuam a pensar que a deferência que o Estado deve ter pelos seus credores decorre duma obrigação moral e dum sentido da honra que devem prevalecer sobre os compromissos contraídos pelo Estado perante os cidadãos em matérias tão cruciais como o direito ao trabalho, à habitação, à saúde, à educação, à segurança social, à justiça, à cultura, à liberdade. Para os portugueses em geral, e para os políticos em especial, é mais importante cumprir o descomunal “serviço da dívida” do que os compromissos que o Estado assume de acordo com a Constituição, ainda que haja cidadãos no desemprego ou a sofrer nos hospitais, nas escolas ou nas empresas. O lema é: antes forretas do que gastadores. Nada de viver acima das suas possibilidades - tal só se admite aos ricos, que têm outras “possibilidades”.

Ora bem, a dívida pública atormenta-nos a todos, não é assim?! Ainda mais do que a dívida privada, mesmo se esta for bem maior do que a pública! Mas em vez de estar aqui a especular, prefiro lembrar uma história antiquíssima, que só a esta distância é que é divertida, e que não deve servir-nos de exemplo, sob pena de atraiçoarmos os fantasmas que mencionei no início deste texto. Para que ninguém me interprete mal, começo por recorrer aos conhecimentos de Carmen Reinhart e Kennet Rogoff, antigo economista-chefe do FMI, quando nos informam que, “entre 1500 e 1800, a França repudiou as suas dívidas em oito ocasiões”, e avisam: “Como os reis de França tinham por hábito mandar matar os grandes credores nacionais, o povo acabou por chamar “sangrias” a esses episódios”. Reconheça-se, aqui, uma das mais antigas e radicais formas de reestruturação da dívida pública de que há memória.

Decidi, porém, recuar no tempo mais ainda do que aquele célebre par de economistas e fazer uma breve incursão pelo reinado de Filipe IV (1268-1314), rei de França, de cognome “o Belo”, filho de Filipe III (1245-1285) e, sobretudo, neto do santo rei Luís IX (1214-1270), mais conhecido como São Luís. Ora, Filipe o Belo ascendeu ao trono quando o Reino de França estava à beira da falência, dado que, segundo uma regra característica do regime feudal, “o rei de França só pode viver do que é seu”. Isto é, não tinha o direito de lançar impostos em todo o país, sob pena dos seus vassalos, sobretudo os senhores feudais, se rebelarem e tentarem derrubá-lo do trono. Ora, os rendimentos da Coroa, certamente suficientes para mandar cantar os cegos, estavam longe de poder assegurar a fidelidade dos barões (cujas mordomias eram altas), ainda menos de poder honrar o cumprimento das alianças com Estados estrangeiros e de sustentar as indispensáveis guarnições militares, além das centenas de familiares da nobreza que iam aumentando a Corte e tinham de viver à custa dela. Pior ainda: não chegavam para financiar inevitáveis guerras, que custavam os olhos da cara.

Que fazer, então?, ter-se-á interrogado Filipe o Belo, que não tinha ao dispor nada que se pareça com os ensinamentos de Marx, Lenine e Milton Friedman. Pois bem, Filipe o Belo decidiu desvalorizar a sua moeda, pondo a funcionar a maquineta para cunhá-la e colocando menos prata e menos ouro em cada peça. O que lhe valeu ser “cunhado” por Dante como “Filipe o Belo, o moedeiro falso”. Mas foi graças à desvalorização da moeda que as rendas, as dívidas, os juros e os censos (feudais), que eram fixos e, por isso, não acompanhavam a inflação, diminuíram significativamente. Terá ficado o Rei ao abrigo das revoltas camponesas, mas quem não apreciou mesmo nada a decisão régia foram os grandes proprietários, os senhores feudais e o clero, clamando que o monarca estava a arruiná-los. O Rei fez orelhas moucas enquanto pôde mas, um sério conflito com o Papa Bonifácio VIII (1235-1303) fez com que ele precisasse do apoio, pelo menos político, dos senhores feudais e do clero, que desde logo exigiram, como contrapartida, o regresso à moeda forte do tempo do bondoso Rei Luís IX.

Claro que Filipe IV lhes fez a vontade. Já então a opção por uma política monetária era uma opção de classe. E as rendas triplicaram. Todavia, os operários, os pequenos comerciantes e artesãos de Paris aliaram-se e revoltaram-se, no dia 30 de Dezembro de 1306. O alvo que escolheram em primeiro lugar foi a casa de um burguês, Estienne Barbette, grande proprietário, conselheiro do Rei e guia deste em matéria de política financeira. Destruído todo o recheio dessa casa, os revoltosos dirigiram-se ao Templo (construído pela Ordem dos Templários em 1240), no qual se tinha refugiado Filipe o Belo. Reunido o seu Conselho, o Rei decidiu que as rendas seriam pagas pela antiga taxa, cedendo às exigências do povo. Mas a vitória popular teve um preço: 28 dos revoltosos, entre eles os três líderes da sublevação, foram enforcados em ulmeiros junto às quatro entradas de Paris. Entretanto, para compensar o enforcamento dos populares, o Rei abriu uma caça aos ricos (curioso equilibrista, este monarca!). É que ele precisava mesmo de dinheiro e de ouro. Tendo já obrigado as classes possidentes - senhores feudais, clero e burguesia - a entregar à Coroa um terço das suas loiças mais valiosas, cujo fabrico foi proibido, expulsou de França os Lombardos, agiotas e mercadores, confiscando os seus bens. A seguir decidiu expulsar os Judeus, em 1306, depois de apreender os seus móveis, as suas casas, o seu dinheiro, os seus créditos, tudo confiscado em benefício da Coroa, com os cofres quase a abarrotar.

O grande golpe, todavia, foi desferido contra a riquíssima e mui poderosa Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, no ano de 1307. Os Templários foram presos, acusados de cuspir na cruz, de renegar três vezes Deus, e de praticar a sodomia, o que escandalizou sumamente um monarca tão “piedoso” (ainda que não o pareça) como Filipe o Belo. A verdade é que os antigos “combatentes de vanguarda” das cruzadas tinham-se tornado, entretanto, em “banqueiros do Ocidente”, operando duma ponta à outra do Mediterrâneo, e da Europa a Jerusalém, graças à segurança e rapidez com que transferiam fundos, melhor do que as companhias italianas rivais. Por isso tinha o Rei de França confiado o seu Tesouro ao Templo, contraindo empréstimos junto dessa Ordem dos “soldados de Deus”, que se tornara rica, mesmo “demasiado rica”, com grandes domínios, terras cultivadas, mercados e portagens. Um verdadeiro “Estado dentro do Estado”, que apenas prestava contas perante o Papa.

Essa a razão que levou Filipe o Belo a vibrar-lhe, de surpresa, na manhã do dia 13 de Outubro de 1307, o golpe fatal. Espantados, os “pobres” Templários não resistiram, nem tiveram tempo para fugir com os seus tesouros ou para exportar os seus metais preciosos. O Rei optou por não confiscar os bens da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo, por pertencerem à Igreja, mas tomou para si a guarda desses bens, para assim usar o ouro e a prata a seu bel-prazer, e gerir o dinheiro, créditos e dívidas consoante a Coroa necessitasse. O grão-mestre da Ordem, Jacques de Molay, ex-banqueiro do monarca e de todos os príncipes da Europa, ardeu na fogueira, tal como muitos outros Templários. Foi assim consumada uma das mais antigas e radicais reestruturações de uma dívida pública que se conhecem. Mas é óbvio que este exemplo dum “banqueiro no churrasco” não pode - nem deve, aliás - ser seguido no século XXI…



comentário
O que não percebo

Isto é uma prevenção ou uma proposta?

Por Álvaro Aragão Athayde no Jornal i a 31 de Dezembro de 2018, às 23:22

Confesso que não percebo onde Alfredo Barroso quer chegar.

Os Templários tinham dois tesouros – o Ouro e a Sabedoria – e de nenhum deles Filipe IV de França, dito "o Belo", se apossou.

Acresce que quer a Dinastia Capetiana, quer a própria França, foram, e permanecem, malditos



Foram doze cavaleiros.




Etiqueta principal: Ideologia.
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