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24 de março de 2019

Política da Cristaleira


um artigo, uma referência, um comentário


o artigo
O movimento 5.7 e o abalo na política da cristaleira

Por João Miguel Tavares no Público a 23 de Março de 2019, às 06:31

Cristaleira Antiga com taças, copos e jarras licoreiras. 

Por política da cristaleira eu entendo o estado de espírito dominante da política portuguesa pelo menos desde o final do ímpeto reformista dos governos de Cavaco Silva. Ela consiste no seguinte: limitar a política a uma gestão do dia-a-dia, abanando o mínimo possível as estruturas do país, e fazendo da imobilidade uma virtude. Tal como a avozinha que não quer que se toque na cristaleira, não vá partir-se alguma coisa, mesmo que o cristal fique a ganhar pó e ninguém dele faça uso, também a política da cristaleira alimenta o medo do futuro, trava todo o desejo de arriscar, vive do temor de que aquilo que aí vem seja sempre pior do que aquilo que já aí está – uma postura extremamente conservadora que, de forma paradoxal, tem sido o grande mantra da outrora revolucionária esquerda portuguesa.

O seu lema poderia ser: “Não mexas que se parte!” É verdade que a política da cristaleira sofreu um forte abalo com a vinda da troika. Mas não é por acaso que essa vinda foi sempre tratada pela esquerda Atlantis como uma imposição do exterior, desligada de qualquer necessidade do país. Mal a troika saiu, a normalidade foi de imediato reposta. A chamada “geringonça” é o maior monumento à política da cristaleira que até hoje a democracia portuguesa avistou: pela primeira vez na história, toda a esquerda se uniu para impor uma política de reversões e reposições, na medida em que era urgente regressar ao passado, e vender a narrativa do memorando do entendimento como “pacto de agressão” (a expressão favorita do PCP). Segundo essa triste narrativa, que conseguiu convencer muita gente, a austeridade foi praticada por sadismo (da Europa) e por masoquismo (do governo PSD-CDS), mas nunca por causa de erros catastróficos da governação ou do caminho seguido pelo país nas duas décadas anteriores.

Desde 2015, aquilo que se tem discutido é invariavelmente o passado – a luta dos professores pela recuperação do tempo de serviço é um bom exemplo –, já que sobre o futuro ninguém parece ter nada a dizer. É por isso que o recém-criado Movimento 5.7, que este sábado apresenta o seu manifesto (“Nascidos a 5 de Julho”), é para mim tão interessante. Eu conheço o Miguel Morgado há alguns anos, gosto bastante dele, e parece-me, de longe, o melhor valor surgido no PSD nos últimos tempos. Mas a razão porque admiro genuinamente o seu percurso resume-se numa frase: ele quer alguma coisa para o país. Querer alguma coisa para o país pode parecer pouco, mais é muito mais do que a totalidade do espectro político português com representação na Assembleia da República tem neste momento para oferecer.

Eu acompanho naturalmente o desejo de um movimento de direita que tenha ideias diferentes a propor, e que esteja disposto a combater a hegemonia cultural de uma esquerda que há demasiado tempo se esforça por instalar um pensamento único no país (ao qual boa parte do PSD também adere). Mas aquilo que mais me agrada no manifesto é mesmo a coragem de enfrentar a política da cristaleira, tantas vezes alimentada pelos próprios jornais. Também aqui é preciso mudar alguma coisa. Aquilo que tenho lido sobre o 5.7 é sempre escrito de uma perspectiva partidária – quem faz parte?, de que partidos vêm?, quem querem tramar? Só falta mesmo o mais importante: saber o que o Movimento 5.7 tem para nos oferecer e de que forma pode ser ele aproveitado para mudar um país que anda há 20 anos a arrastar-se na mediocridade política, social e económica.

Jornalista

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a referência
Reaccionário

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

O termo reaccionário tem estreito vínculo com o termo "revolucionário"ː ambos estão à margem do fluxo temporal, desvalorizando o presente (hic et nunc) para invocar o passado nostálgico (reaccionário) ou um devir idealizado (revolucionário). Para o reaccionário, o ideal reside no passado, na nostalgia, no que foi e não será mais, salvo se retomarmos os antigos valores. É associado erroneamente aos indivíduos que defendem uma manutenção do status quo político e social diante de propostas de mudança social ou de ideias voltadas para a transformação da sociedade (contrarrevolucionários).

São, notadamente, confundidos com conservadores, que, ao contrário, valorizam o presente e admitem mudanças que respeitem a história, os valores sociais, bem como a tradição, responsabilizando-se pelo devir. Seus princípios são confundidos com princípios conservadores e liberais, que, por sua vez, são acusados de serem contrários à mudança política ou social.

Descrição

O sentido histórico do termo "reaccionário" refere-se àquele que se contrapõe ao presente, e consequentemente às mudanças revolucionárias, sociais e políticas. Nesse sentido, entende-se como reacção o conjunto de forças que actuam no sentido de retorno ao estado anterior.

A Batalha de Waterloo (1815) confrontou as Forças Revolucionárias Francesas
lideradas por Napoleão contra as Forças Reaccionárias Britânicas e Prussianas.

O reaccionário é gémeo do revolucionário. O termo foi empregue pela primeira vez no contexto da Revolução Francesa (1789-1799) no sentido de que reaccionários eram os que reagiam contra as mudanças iniciadas pela Revolução e pretendiam um retorno ao Antigo Regime.

No Manifesto do Partido Comunista, Marx e Engels afirmam que as:
Classes médias pequenos comerciantes, pequenos fabricantes, artesãos, camponeses – combatem a burguesia porque esta compromete sua existência como classes médias. Não são, pois, revolucionárias, mas conservadoras; mais ainda, são reaccionárias, pois pretendem fazer girar para trás a roda da história.
Nesse sentido, as religiões são, às vezes, qualificadas como reaccionárias. Isto decorre, em parte, da oposição a filósofos religiosos como Louis de Bonald, Joseph de Maistre e François-René de Chateaubriand, e em parte do que Karl Popper chamou de crença progressista (identificada como historicista) no caráter manifesto da verdade que não conduz à construção do conhecimento mas à procura dos obstáculos à manifestação da verdade. Ao se identificar a religião como geradora de preconceitos, procura-se abolir a religião.
Analisar, afastar esse emaranhado de forças e tendências conflitantes e conseguir penetração em suas raízes, atingindo as forças de impulsão universal e as leis de transformação social – essa a tarefa das Ciências Sociais, tal como a vê o historicismo.

Esta página, que foi editada pela última vez às 21h26min de 9 de Dezembro de 2018, foi recuperada e adptada ao Português de Portugal às 21h27min de 23 de Março de 2019. Ver original aqui.


o comentário
A Política da Cristaleira

Por Álvaro Aragão Athaude no Blogue coisas & loisas a 23 de Março de 2019, às 22:45

Não sei se a esperança que João Miguel Tavares deposita em Miguel Morgado e no seu recém-criado Movimento 5.7  (“Nascidos a 5 de Julho”) será ou não defraudada. 

Não sei eu e não sabe ninguém, só o futuro o dirá.

Mas confesso que tenho pouca esperança em Miguel Morgado e no seu recém-criado Movimento 5.7  (“Nascidos a 5 de Julho”).


E tenho pouca esperança porque O Nosso Manifesto abre com esta bombástica frase:
A direita atravessa hoje uma crise política e cultural que é evidente para todos. O perigo que a espreita não é menor do que a oportunidade que abre – refundar-se e reconstruir-se para depois se federar. Este é o momento para iniciar essa tarefa.

A direita?

Mas o que é a direita

Sei o que é estar à direita, ou estar à esquerda, de alguém, ou de algo, mas a direitaA direita não faço ideia do que seja! E eles também não…

Os Partidos Políticos Portugueses no Diagrama de Nolan,
segundo  Ricardo Campelo de Magalhães.

Quanto ao resto, isto é, quanto ao evidentíssimo reaccionarismo dos partidos políticos portugueses, acho que deginá-lo por “política da cristaleira” foi uma ideia genial. Verdadeiramente genial.



Fontes
  1. "O movimento 5.7 e o abalo na política da cristaleira". João Miguel Tavares. Público. Publicado a 23 de Março de 2019, às 06:31. Recuperado a 23 de Março de 2019, às 20:11.
  2. "Tempo Volta Para Trás - Tony de Matos". YouTube. Publicado por colimer a 14/05/2008. Recuperado a 23/03/2019.
  3. "Cristaleira Antiga Com Taças Copos Jarras Licoreiras Geleira" [Para aceder copiar e colar esta hiperligação https://produto.mercadolivre.com.br/MLB-723312717-cristaleira-antiga-com-tacas-copos-jarras-licoreiras-geleira-_JM]. Mercado Livre. Anúncio sem data de publicação, mas anterior a 14/07/2018. Recuperado a 23/03/2019.
  4. "Reacionário". Wikipédia. Esta página foi editada pela última vez às 21h26min de 9 de dezembro de 2018. Recuperada às 21h27min de 23 de março de 2019.
  5. "O Nosso Manifesto". Movimento 5.7. Sem data. Recuperado a 23 de Março de 2019, às 21:51.
  6. "Gráfico de Nolan". Wikipedia. Esta página se editó por última vez el 19 nov 2018 a las 01:31. Recuperada el 23 marz 2018 a las 22:13.
  7. "Bardam€rda para o Fascismo!". Ricardo Campelo de Magalhães. O Insurgente. Publicado a 09 de Outubro de 2017. Recuperado a 23 de Março de 2019, às 22:35.


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